Não fazer listas. Guardar a
agenda numa gaveta fechada à chave e deitar a chave ao rio. Usar despertador
para aproveitar as manhãs. Ler. Não ligar o computador. Não ir ao facebook.
Esquecer o email. Deixar o telemóvel
em casa. Tomar pequenos-almoços como se fossem almoços. Ler. Não verificar o
email. Não ir ao facebook. Ler. Passear à beira-mar. Nadar. Boiar de olhos abertos. Ouvir Ali Farka
Touré. Desligar tudo das tomadas. Fumar tabaco de enrolar ao final da tarde. Beber cerveja e
mojitos. Jantar sem tomar banho. Beber vinho e sumo
de laranja. Ler as notícias só em papel. Não pôr fotografias de pés na
areia no facebook. Ler. Comer uma bola de berlim e uma maçã. Dormir com o pé direito de
fora. Passear com a minha cadela. Vestir todos os dias o mesmo vestido.
Andar sempre de chinelos. Não secar o cabelo. Ler. Não pôr fotografias do mar
azul no facebook. Não responder a emails. Arrumar o computador num armário bem
alto. Escrever à mão. Dormir com o pé esquerdo de fora. Passear com a minha
cadela pela sombra. Aproveitar para dar ao meu pai, que fez anos, não um after shave, mas um
prato de bacalhau à brás e outro de arroz doce. Pôr a mesa na varanda. Desligar
a televisão. Escrever uma carta aos meus amigos emigrados ou em vias de. Pôr os
envelopes no correio, até ao outro lado do mundo. Prometer que os vou visitar.
Talvez até emigrar. Ler. Adormecer destapada, de barriga para cima. Deixar os
meus gatos com amigos. Não perguntar todos os dias se eles estão bem e a dar
muito trabalho. Não ficar ansiosa se não me responderem logo. Passear sozinha.
Dizer seis palavras num dia inteiro. Reparar. Escrever num pequeno bloco à mão.
Ver. Escrever num pequeno bloco à mão. Observar. Escrever à mão. Dizer cinco
palavras num dia. Misturar melancia com vinho tinto e pêssegos com água. Comer
laranja à noite. Não decidir. Ouvir conversas alheias na praia. Anotar
tudo num bloco, à mão. Desenhar pessoas com palavras num bloco. À mão. Levar maçãs
e água para a praia, mas comer amêijoas e pão a escorrer manteiga. Pode ser mais uma, se faz favor. Esquecer-me das maçãs na
mochila. Bater, como uma selvagem, em pessoas que deixem beatas na areia. Adormecer
de janela aberta. Falar sozinha. Meter num frasco o cheiro do Verão à noite. Ir para a cama à meia-noite e às sete da manhã. Lembrar-me dos
sonhos no dia seguinte. Não os contar. Não ir ao facebook. Falar
sozinha. Ler. Ler em voz alta. Ver o meu pai dar gelado à cadela e não dizer
nada. Dar-lhe fiambre de peru às escondidas. Falar com ela. Meter o cheiro dos
pinheiros mansos num frasco. Decorar um poema. Brincar com os filhos dos
outros. Escrever um bloco inteiro à
mão. Comprar um novo. Acreditar que acreditar em meditação já é meditar. Não
escrever nenhum livro. Não plantar nenhuma árvore. Não ter nenhum filho. Arranjar
desculpas para estar sozinha. Chegar de comboio. Meter conversa no comboio. Ouvir esta música pelo menos uma
vez por dia.
"Tudo me espanta, gramo a vida, quero morrer mais lá para o Verão." (Fernando Assis Pacheco)
terça-feira, 25 de junho de 2013
terça-feira, 28 de maio de 2013
O Vitória ganhou a taça, avô!
O título não é verdadeiro, porque nunca tratei o meu avô por avô. Ao meu avô materno sempre chamei “bubu”. No
Norte não há avós com v. O meu avô era vitoriano por nascimento e convicção.
Dos ossos ao coração. Lembro-me vagamente de ele ter, no escritório, uma
fotografia das netas e outra de uma equipa, de um qualquer ano que não sei
precisar, do Vitória. Chegou a ser da direcção do clube e usava, volta e meia,
um emblema do Vitória na lapela do casaco. Como nunca gostei de futebol, nunca
liguei muito às histórias que ele, de vez em quando, contava. Hoje tenho pena,
muita pena, de não ter fixado com atenção essas recordações a preto e branco.
Poderia ter construído, na minha memória e na minha fantasia, um futebol sem aquele
ruído de fundo dos estádios, sem a voz dos relatos que nunca gostei de ouvir.
Claro que, no outro dia, gostei de
ver as imagens dos vitorianos a festejar. Mas isso acontece-me sempre que há
uma multidão a celebrar, a alegria contagia-me, mesmo que aquilo pouco me diga,
pega-se à pele.
Se, na minha infância e adolescência, o futebol me era indiferente, hoje intriga-me: intriga-me o que move as pessoas, o sítio de euforia, o momento em que saímos de nós para nos entregarmos a algo que nos controla.
O meu avô, que tinha muita vida dentro dele e gostava muito de viver, morreu antes do tempo. Quando morreu já era avô e já tinha careca – nós gostávamos de o arreliar, tocando-lhe nela -, mas foi antes do tempo, porque a vida não estava cansada dele nem ele farto da vida.
Foi só depois de o meu avô ter morrido que passei a dizer, sempre que me perguntavam pelo clube, que era do Vitória. É só por causa dele que respondo isso. Sei lá quem anda a treinar o clube, quem são os jogadores. Mas o meu inconsciente decidiu assim e eu obedeço-lhe.
Percebi, muitos anos depois, que o meu avô, apesar das nossas diferenças, era mais generoso. Na minha adolescência, eu saía da sala se havia jogo de futebol. Televisão ligada, rádio, barulho, e eu a querer ler poesia. Na altura, com 14 ou 15 anos, eu achava que Fernando Pessoa tinha vindo ao mundo para me dizer coisas que mais ninguém me dizia. Eu saía da sala, mas o meu avô, o meu avô deu-me a colecção de Pessoa inteira ilustrada.
Se, na minha infância e adolescência, o futebol me era indiferente, hoje intriga-me: intriga-me o que move as pessoas, o sítio de euforia, o momento em que saímos de nós para nos entregarmos a algo que nos controla.
O meu avô, que tinha muita vida dentro dele e gostava muito de viver, morreu antes do tempo. Quando morreu já era avô e já tinha careca – nós gostávamos de o arreliar, tocando-lhe nela -, mas foi antes do tempo, porque a vida não estava cansada dele nem ele farto da vida.
Foi só depois de o meu avô ter morrido que passei a dizer, sempre que me perguntavam pelo clube, que era do Vitória. É só por causa dele que respondo isso. Sei lá quem anda a treinar o clube, quem são os jogadores. Mas o meu inconsciente decidiu assim e eu obedeço-lhe.
Percebi, muitos anos depois, que o meu avô, apesar das nossas diferenças, era mais generoso. Na minha adolescência, eu saía da sala se havia jogo de futebol. Televisão ligada, rádio, barulho, e eu a querer ler poesia. Na altura, com 14 ou 15 anos, eu achava que Fernando Pessoa tinha vindo ao mundo para me dizer coisas que mais ninguém me dizia. Eu saía da sala, mas o meu avô, o meu avô deu-me a colecção de Pessoa inteira ilustrada.
Eu tinha muitas discussões com o
meu avô. A minha avó abria a boca e dizia que eu discutia política como um
homem. Sobretudo na minha adolescência, provocava-o sem medo, dizia-lhe que era
comunista e apresentava-lhe as minhas teorias apaixonadas, quase punha Jesus
Cristo a fazer a revolução armada. Não era bem aceite, mas o meu avô, o meu avô
mandou encaixilhar um poema meu, uma vez. Chamava-se “Liberdade” e, pelo meio,
tinha um verso sobre “fazer amor entre lírios e delírios”. O meu avô era
conservador em muitas coisas, mas gostava mais de nós do que dessas coisas
conservadoras. O poema ainda lá está, numa moldura, com uma letra muito redonda, um
orgulho.
Hoje queria fazer com ele o
que ele fazia com os meus poemas. Festejar em conjunto. Esquecer-me do facto de
gostar ou não de futebol e ficar contente só porque ele ficaria contente.
Dizer-lhe que o Vitória, caramba, o Vitória ganhou a taça de Portugal, bubu!
sexta-feira, 24 de maio de 2013
Pontes
Tenho uma tara por pontes. E já que estamos em modo de confissões,
também tenho um fraquinho por aeroportos, gosto de ver o avião na pista; por estações
de comboios, gosto de comboios velhos e de estações pequenas; e por metros,
gosto de ir sentada, frente a frente com as pessoas. Mas as pontes. As pontes –
têm de ter uma certa escala – só existem nas cidades e nos filmes. E nas
fotografias. Existem de uma forma visual, com um grande corpo, e tenho muita pena
de não saber mostrá-las num texto. Não se sente nada se disser que só gosto mesmo de conduzir
se estiver a atravessar uma ponte. Tem de ser grande, tem de me parecer enorme,
vista de baixo, vista de cima, vista dos lados. Mesmo que acrescente luz ao texto, mesmo que diga que está sol quando atravesso a ponte de carro, não chega para falar dela. Paciência. Mas continuo a gostar muito de passear perto de uma ponte, de ver uma da janela. Uma ponte muda tudo na paisagem. Põe a paisagem em
movimento. A mim, põe-me em movimento também. Deve ser por isso que gosto
delas, de estações de comboio antigas, de aviões na pista e de me sentar no
banco do metro.
terça-feira, 23 de abril de 2013
Um Gepeto em Veneza
Estas são as máscaras que tenho usado nas mais recentes andanças do Gatuno. Comprei-as numa viagem a Veneza: uma foi comprada numa cooperativa de artistas local e as outras duas a um artesão que me fez logo lembrar o Gepeto. É, como a personagem da história, italiano, mas este é de Veneza e, em vez
de dar vida a um burattino, dá vida a máscaras. Tem para todos os
preços e gostos, mas as que escolhi são feitas à mão e seguem a moda antiga da
cidade dos disfarces, das gôndolas e dos canais.
Sinto uma estranheza boa
diante de algumas máscaras, acho-as misteriosas, encantatórias. Depois de ter
passado um Carnaval em Veneza de bocaaaberta, cheguei a fazer, quando andava no
TEUC, um workshop de máscara: foi uma experiência intensa, porque as máscaras, já sabe,
revelam mais do que escondem.
Os miúdos a quem as mostrei também
não conseguem tirar os olhos delas. Tenho lido partes do livro com uma ou outra
posta e, para que resulte cada vez melhor, ponho-me a ensaiar e ensaiar em
casa. As horas que passei no teatro na faculdade ganharam um sentido novo (os sentidos subtis se calhar passaram-me despercebidos, ou não, mas isso não interessa nada agora).
Dinamizar uma leitura para
crianças exige reflexão e treino, não sai na hora nem cai do céu sem
aviso. Na Pós-Graduação em Livro Infantil, também temos (para além da parte
teórica) workshops de animação da
leitura e são horas maravilhosas em que andamos a ler poemas em voz alta, a
fazer sons, a espreitar por janelas imaginárias ou a fazer de pássaro pela sala,
ondulando os braços no ar. Fico tão abstraída de tudo que até me esqueço que os
nossos colegas dos PhD’s da Católica, de fato e cara passados a ferro, nos vêem
através do vidro…
Tudo o que parece simples é quase
sempre difícil e ler um livro a crianças, agarrá-las pelo colarinho (como
também se costuma dizer no jornalismo), não é excepção – e o difícil não é só a
idade e a concentração (ou a falta dela) dos miúdos. O delicado é também
encontrar um equilíbrio, porque agarrar pelo colarinho não significa folclore e
excesso, mas sim vivacidade e alguma ousadia.
O facto, porém, de ser difícil
encontrar esse sítio de intriga e de desassossego não lhe retira diversão. A
única parte aborrecida é mesmo o país estar fechado para obras e com tabuleta à porta a
dizer “Volte mais tarde”. Como não há dinheiro para nada e como, às tantas, é
tudo tão divertido, ninguém se lembra que o tudo-tão-divertido dá trabalho, que
os livros são para vender e que os autores (os escritores, os ilustradores, os
editores) infelizmente não se alimentam só de gargalhadas.
A boa notícia é que, algumas vezes, o treino
de ler poesia no chão ou a fingir que se voa, sob o olhar engravatado e atónito
da maioria, ajuda-nos a virar a cabeça do avesso para encontrar algumas
soluções. Com jeito, lá se percebe que os autores afinal também se alimentam de batatas assadas e arroz de ervilhas e até há quem se empenhe no tempero. Apesar da tabuleta à porta no país, já dizia (ou terá dito) Galileu: eppur si muove.
sexta-feira, 12 de abril de 2013
Uma mala sem descanso
Dizem-me carinhosamente que
parece uma mala de palhaço. Reconheço que sim, que está mais próxima disso do
que da poesia dos gatos, aqueles que são tão elegantes e cheios de silêncios
como os poemas se tivessem patas. Mas a realidade é que o Gatuno não transpira
propriamente poesia de gatos pelos poros, é mais um felino trapalhão e cómico
do que um ser posto na terra pelos deuses para confundir os sentidos humanos.
Assim sendo, não me parece despropositado que esta seja, a partir do momento em que a fui buscar à garagem e lhe limpei o pó, a mala do gato Gatuno. E parece-me bem que seja vermelha como as dos palhaços - o Gatuno gosta de fazer rir e o vermelho é a cor da ira que ele sente diante do Trombudo. Tenho esta mania das histórias para as histórias. Como se uma cor precisasse de uma história, como se houvesse uma razão para o verde ser verde e o amarelo amarelo.
Nesta história da mala, as histórias não se ficam por aqui. Na minha rua (ela não é minha, mas eu gosto de lhe chamar assim), há uma loja de antiguidades - e de velharias... - que tem uma mala linda. Namoro-a todos os dias e, pelo menos, às terças e quintas vou lá apreçá-la e vê-la de perto. O senhor tira-a do móvel, eu aprecio-lhe o tamanho, as formas, e saio de mãos a abanar. Aquela mala tem uma história, e eu podia inventá-la. Está cheia de autocolantes de viagens. É velha e teatral, tem um passado naquele castanho gasto, não deve ter uma, mas imensas histórias. Aquela mala tem certamente, e pelo menos, uma história comprida, mas não é a minha história (pelo menos enquanto não morar nela como nesta rua que gosto de chamar minha).
Já esta mala vermelha foi, no passado, do meu tio António, casado com a minha tia Elisa, irmã da minha avó. O meu tio António tinha um negócio de relógios na baixa de Lisboa e viajava muitas vezes ao longo do ano para o estrangeiro. Herdei os postais que ele escrevia à minha tia. Preciosos retratos antigos dos sítios por onde passava e que começavam invariavelmente assim: “Minha querida, que estejas bem de saúde é o que mais desejo”. Sempre gostei de ler os postais, de ver as saudades que ele tinha dela, os beijos que lhe escrevia à mão, as queixas sobre a língua indecifrável na Alemanha, e sobre o frio mais frio e o ar-condicionado mais quente na Suíça. Queria dar um destino aos postais, o meu pai pensou que me pudessem inspirar uma história, mas, sempre que os lia e relia, nada acontecia que não fosse gostar de os ler e voltar a fechá-los na gaveta.
Por estes dias fui buscá-los e meti-os dentro da mala. Agora estão lá guardados, ao lado das máscaras de gato e do livro do Gatuno. Estão apenas lá dentro e ninguém, a não ser eu, se apercebe disso. Mas, para mim, a mala ganhou outro sentido. É que como se as viagens continuassem.
O Gatuno veio desassossegar a mala vermelha que estava pousada na garagem. Mas uma mala não serve para estar parada. Como um livro, serve para viajar, coleccionar histórias. Ir para um hotel em Zurique ou para uma biblioteca na Amadora. Tivesse ido um dia pela mão do meu tio-avô, vá agora pela minha: a mala está outra vez no seu caminho.
Apesar disso, mantenho o caso clandestino com a outra na loja de antiguidades. E um dia destes ainda vou raptá-la. Vou agarrá-la com as mãos e, mesmo que nunca tenha sido minha nem de ninguém que eu conheça, trazê-la para mim. Farei como faço com as histórias que leio: apropriar-me e deixar o resto acontecer.
Em narrativas como as destas malas andarilhas, sabemos só o passado: alguma vez o meu tio António, que só me conheceu até eu ser adolescente, adivinhou que eu ia andar com a mala dele por aí, com um Gatuno lá dentro?
quarta-feira, 20 de março de 2013
Roma cheia de gatos
Na noite em que deixei Roma para
trás, depois de lá ter vivido um ano, olhei para a Fontana de Trevi e não deitei
a moeda. Armei-me em esperta, porque diz o adágio que quem deita a moeda
regressa. Fiz de propósito, naquela noite tinha a certeza que voltaria
e, por isso, podia guardar a moeda no bolso e ir comer um gelado. Já lá vão 10
anos, mais coisa, menos coisa. E nada. Nunca mais voltei. Ando com
aquela moeda entalada na garganta. Nunca mais voltei a Roma, nem a Itália, onde -
apesar de ter ido para lá estudar - fiz das melhores férias da minha vida: entre a
Sardenha e a Sicília, a ver nascer o sol em barcos, a dormir nas praias à noite,
a acordar às seis da manhã e a ter o mar só para mim e para os meus amigos, a
andar à boleia por montes perdidos na Sicília em carrinhas de caixa aberta
tapadas por uma lona. Não víamos nada lá para fora, íamos aos rebolões lá
dentro. Os condutores gritavam-nos: Tutto bene? E nós, perdidos de tudo menos
de medo, respondíamos: Tutto! Nunca mais voltei a Roma, nem a Itália. E Itália
é o país mais bonito que já visitei. Roma a cidade onde, se pudesse,
gostava de viver. Mas Roma e Lisboa devem ser primas, por isso também gosto de
estar aqui. Nos próximos dias, dez anos depois, vou finalmente regressar a Itália: a Veneza e a Bolonha. Vai
ser bom, pelo menos vou ver a língua, ouvi-los cantar, porque falar, falam com
as mãos. A língua e a comida, pelo menos em Itália, também são primas. Mas não
vai ser Roma ainda, Roma cheia de gatos, e eu ando com Roma aqui, bem atravessada na
garganta. Tento não forçar o encontro, porque a fonte se iria rir de mim. Mas
se a vida não me levar, pois bem, terei de me meter num avião (e ir lá deixar a
moeda).
segunda-feira, 4 de março de 2013
Piruças
A minha anarco-rafeira, que foi
apanhada na rua, já tem 15 anos. Quem a conhece sabe bem como aquela vira-latas
conseguia, durante os anos de juventude, transformar tudo à volta num alvoroço:
andava sempre a 200 à hora e arrebitava cachimbo para todo o lado. Insubmissa,
desobediente, cómica, porque pequena, era um terror próximo do desenho animado.
Agora, já não é assim. Velhinha e com o pêlo branco, passa os dias deitada. Já
não consegue subir bem para a cama, volta e meia cai nas escadas e fica à
espera que a vamos buscar. No outro dia, nem reagiu quando levámos a Nico, a
gata da minha prima, lá para casa. Apesar de agora na velhice ter, pelos vistos, aprendido
a aceitar mais, a ladrar e a rosnar menos, posso dizer que nunca conheci uma
cadela tão punk como a minha. E,
claro, nunca me lembrei que ela fosse envelhecer.
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