Estas são as máscaras que tenho usado nas mais recentes andanças do Gatuno. Comprei-as numa viagem a Veneza: uma foi comprada numa cooperativa de artistas local e as outras duas a um artesão que me fez logo lembrar o Gepeto. É, como a personagem da história, italiano, mas este é de Veneza e, em vez
de dar vida a um burattino, dá vida a máscaras. Tem para todos os
preços e gostos, mas as que escolhi são feitas à mão e seguem a moda antiga da
cidade dos disfarces, das gôndolas e dos canais.
Sinto uma estranheza boa
diante de algumas máscaras, acho-as misteriosas, encantatórias. Depois de ter
passado um Carnaval em Veneza de bocaaaberta, cheguei a fazer, quando andava no
TEUC, um workshop de máscara: foi uma experiência intensa, porque as máscaras, já sabe,
revelam mais do que escondem.
Os miúdos a quem as mostrei também
não conseguem tirar os olhos delas. Tenho lido partes do livro com uma ou outra
posta e, para que resulte cada vez melhor, ponho-me a ensaiar e ensaiar em
casa. As horas que passei no teatro na faculdade ganharam um sentido novo (os sentidos subtis se calhar passaram-me despercebidos, ou não, mas isso não interessa nada agora).
Dinamizar uma leitura para
crianças exige reflexão e treino, não sai na hora nem cai do céu sem
aviso. Na Pós-Graduação em Livro Infantil, também temos (para além da parte
teórica) workshops de animação da
leitura e são horas maravilhosas em que andamos a ler poemas em voz alta, a
fazer sons, a espreitar por janelas imaginárias ou a fazer de pássaro pela sala,
ondulando os braços no ar. Fico tão abstraída de tudo que até me esqueço que os
nossos colegas dos PhD’s da Católica, de fato e cara passados a ferro, nos vêem
através do vidro…
Tudo o que parece simples é quase
sempre difícil e ler um livro a crianças, agarrá-las pelo colarinho (como
também se costuma dizer no jornalismo), não é excepção – e o difícil não é só a
idade e a concentração (ou a falta dela) dos miúdos. O delicado é também
encontrar um equilíbrio, porque agarrar pelo colarinho não significa folclore e
excesso, mas sim vivacidade e alguma ousadia.
O facto, porém, de ser difícil
encontrar esse sítio de intriga e de desassossego não lhe retira diversão. A
única parte aborrecida é mesmo o país estar fechado para obras e com tabuleta à porta a
dizer “Volte mais tarde”. Como não há dinheiro para nada e como, às tantas, é
tudo tão divertido, ninguém se lembra que o tudo-tão-divertido dá trabalho, que
os livros são para vender e que os autores (os escritores, os ilustradores, os
editores) infelizmente não se alimentam só de gargalhadas.
A boa notícia é que, algumas vezes, o treino
de ler poesia no chão ou a fingir que se voa, sob o olhar engravatado e atónito
da maioria, ajuda-nos a virar a cabeça do avesso para encontrar algumas
soluções. Com jeito, lá se percebe que os autores afinal também se alimentam de batatas assadas e arroz de ervilhas e até há quem se empenhe no tempero. Apesar da tabuleta à porta no país, já dizia (ou terá dito) Galileu: eppur si muove.