sábado, 12 de maio de 2012

O Sassetti na nossa adolescência

Um amigo de infância, o Eduardo, enviou-me ontem uma mensagem. Era um admirador do músico. Assim que soube da morte do Bernardo Sassetti, lembrei-me logo deste meu amigo, que tem um gosto irrepreensível. Estava consternado.

Na mensagem perguntava-me se eu me lembrava, dizia que tinha sido a nossa primeira entrevista. Por acaso, não foi a minha primeira entrevista, respondi-lhe. A minha primeira entrevista foi, de facto, nesse Guimarães Jazz muito longínquo - acho que nem treze anos tinha feito ainda -, mas foi ao Hermeto Pascoal.
Durante a adolescência, tínhamos um grupo que escrevia umas coisas para o jornal local, o Povo de Guimarães. Nesse Guimarães Jazz íamos em bando entrevistar músicos a sério. É muito divertido pensar hoje nas perguntas que um bando de adolescentes em descoberta fazia a artistas como aqueles. Perguntávamos tudo: sobre o amor, sobre deus, sobre a arte. Fazíamos as perguntas mais espantosas, e víamos respostas no que nos diziam. Era um deslumbramento. Era mais poesia do que jornalismo, para ser sincera.
Bom, a primeira entrevista deste bando foi ao Bernardo Sassetti. Eu não fui, infelizmente. Mas ouvi-os nos dias seguintes a contar cada detalhe de cada resposta. Estavam em estado de encantamento. Ainda por cima o Bernardo Sassetti não só tinha talento, como era giro que se fartava. As meninas ficaram enfeitiçadas. Os rapazes também.
Nessa altura usavam-se gravadores com umas cassetes muito pequeninas. Como é evidente, à falta de material, reciclávamos as cassetes, gravando entrevistas umas por cima das outras. Mas havia duas intocáveis: a do Sassetti e a do Hermeto Pascoal. Eram pura magia. Acontece que alguém gravou por cima da do Sassetti e a entrevista dele eclipsou-se. Ninguém queria acreditar. Esse meu amigo de infância não se conformava. Por cima da do Sassetti, foi gravada uma entrevista à Matilde Rosa Araújo. Foi uma boa entrevista também, mas nós éramos adolescentes… Já não queríamos ouvir histórias para a infância. Naquela altura, nada nos tocava como a música, o amor e a poesia.
Naquela altura o bando ficou em estado de enamoramento pelas mãos, pelo piano, pela afabilidade do Sassetti. Será que ele se apercebeu do tamanho daquela inocência?
Já foi há quase 20 anos. Mas esse meu amigo de infância, o Eduardo, não se esqueceu. Enviou-me logo uma mensagem, queria saber se eu me lembrava. Lembro-me perfeitamente. E não estive lá.

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